Venham leis e homens de balanças Mandamentos daquém e dalém mundo Venham ordens, decretos e vinganças Desça o juiz em nós até ao fundo Nos cruzamentos todos da cidade Brilhe, vermelha, a luz inquisidora Risquem no chão os dentes da vaidade E mandem que os lavemos a vassoura A quantas mãos existam, peçam dedos Para sujar nas fichas dos arquivos Não respeitem mistérios nem segredos Que é natural nos homens serem esquivos Ponham livros de ponto em toda a parte Relógios a marcar a hora exacta Não aceitem nem votem noutra arte Que a prosa de registo, o verso data Mas quando nos julgarem bem seguros Cercados de bastões e fortalezas Hão-de cair em estrondo os altos muros E chegará o dia das surpresas "Os Poemas Possíveis", 1966