O teu coração: superfície de Marte Nenhum ofício de gente logra sondar-te Por mais que o feito nos tente Não há resquício de alento O ar: não há quem respire-o Jaz um deserto no Empíreo A face inscrita nos cavos Da crosta ocre semelha A triste cara do Cristo Em sacra argila vermelha Feita por mãos de além-arte Porém são traços vazios Incontinências do solo Em Marte pouso é martírio Sob as estrelas do colo Teu coração montanhoso Não estende aeroportos Para as ridículas naves Abarrotadas de lírios E bagatelas terráqueas Lançadas ao rés do cosmo Sem conhecer contraparte Meu coração insulado Mais vate do que astronauta Tem que singrar outra esfera Cegar o sol na soleira Deixar a lua aterrada Largar a casa na vida Pedir guarida pra Nasa Roubar foguete e cometa Pra quando enfim te abordar Te sentir o céu rarefeito Se intoxicar no metano Congestionar de teu nada Teu coração não difere Do coração de outras musas Que atraem tuberculosos Castos de olheiras escuras E espalham de muito longe (De Atlântida, França ou Marte) Seu halo melado visgo Mas quando chegamos perto Na Europa são niilistas Nos mares são espadartes Em Marte nos causam isto Que causas nos que se arriscam De estro e de peito abertos E liras alanceadas Na beira de algum vesúvio O estro sofre estupores A lira, letais vapores E o anjo - pobre do anjo Quase que sofre um enfarte O teu coração: superfície de Marte